Ontem perdi meu daimon na pia. Bem verdade que ela estava escorregadia pelo detergente, um pouco sombria de gordura , soterrada pela louça de vários dias.Mas nada disso consistia em razões para engolir meu daimon! Ela o engoliu por pura gula. Para fugir do tédio circular do bom-bril na panela. Quis o meu daimon para fantasias escusas, dessas que só se vê nos filmes... O meu daimon não se fez de rogado. Escorregou na viscosidade do detergente e foi sumindo pela garganta escura da pia. A louça, essa entediada dama amante dos horários, torceu o nariz e lançou olhares maledicentes...Na solidão ladrilhada da cozinha, restaram eu - sem meu daimon - e o exército de panelas, pratos, copos, talheres e quinquilharias plásticas. O relógio, impaciente nos seus ponteiros, apontava para as funções do cotidiano. E o meu daimon, evadido sabe-se lá em qual confim do esgoto. Peguei então três xícaras de farinha, três ovos, uma xícara de leite, uma colher de chá de fermento, duas xícaras de açúcar , uma pitada de sal e cinco gotas de baunilha.Coloquei tudo numa tijela e bati um bolo ( sem daimon ). Assei-o em forno moderado. Não o comi. Estava solado como a alma das mulheres que perderam seus daimons!A pia? Essa acabou o perdendo numa curva do cano.
terça-feira, 18 de março de 2008
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Um comentário:
Lindo texto!!!
E diz tudo sobre a derrubada de tabus (em minha interpretação), sim pois o amor realmente é p/ ser expermentado, provado, degustado sem nenhum pudor, sem medo de engordar.
Parabéns Márcia! Continue iluminando-nos com suas palavras.
Débora Nobre.
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