Vitalina cultivava rosas no jardim. Brancas, vermelhas, amarelas e, por incrível que pareça, rendadas. Gostava de acordar de manhãzinha e aspirar o "cheiro do amor", como ela mesma costumava definir o misterioso aroma das rosas. Não era egoísta e compartilhava com os vizinhos aquele prazer rosado. Cedia rosas para os buquês das noivas, para os caixões dos defuntos, para os cabelos das moças, e para as bruxas amigas que com elas fabricavam estranhas poções. Vivia feliz entre um canteiro e outro, e achava que um dia o mundo todo cheiraria a rosa...
E assim, nesse cotidiano rosáceo, Vitalina testemunhou eleições e golpes. Viu Juscelino passar em frente à sua casa e lhe deu uma rosa. Recebeu Goulart com um botão bem vermelho. Tonteou com tanto perfume que acabou acreditando em Jânio, e lhe deu também uma rosa. Rosa esta que lhe causou uma rusga na vizinhança: Sobral Pinto, o seu amado vizinho, enfureceu-se com o cartaz de uma vassoura que Vitalina cismou em pendurar na janela. O que Sobral nem de longe desconfiava é que Vitalina era uma bruxa ativista que pensava que a tal vassoura era um simples logotipo do PBA, Partido das Bruxas Anárquicas.
Vitalina recusou-se a ceder suas rosas ao golpe. Escondeu-as atrás de uma cerca e à noite, quando a cidade toda dormia, regava-as e podava os espinhos. As rosas cresceram clandestinas. Aprenderam a despitar o aroma e só se abriam quando não havia ninguém por perto. O comunismo rosado era mal visto naqueles dias... Mas Vitalina, militante convicta do PBA, sempre arrumava um jeito de dividir suas rosas com os vizinhos. E foi assim que uma noiva casou-se com um buquê de rosas disfarçadas de jasmins e uma alma cruzou o Leto segurando uma rosa travestida em lírio...
Vitalina não viveu para ver a libertação dos seus canteiros. Morreu durante o reinado golpista. Não levou suas rosas para dar de presente a Hades. Deixou-as comigo junto com um misterioso aviso: " Não deixe que a Rosa de Plástico entre no canteiro."
Depois da sua partida, corri a fazer um cartaz: PROIBIDO ROSA DE PLÁSTICO. Finquei-o bem na entrada dos canteiros. As rosas, avessas a toda e qualquer falsificação, agradeceram.
Até que chegou o dia que Vitalina tanto temia: uma rosa de plástico surgiu nas cercanias. Chegou exalando um perfume barato, uma santidade medíocre, uma ternura suspeita. Escondeu os espinhos, pensando que assim seria bem recebida. Que tola. A tonta não sabia que as rosas nunca escondem os seus espinhos... Mas a Rosa de Plástico pouco sabia das rosas e de tanta ignorância se nomeou Rosinha. Que tola. A tonta não sabia que as verdadeiras rosas não aceitam os diminutivos...
E assim, as rosas de Vitalina expulsaram aquela tosca falsificação.
Mas como a Rosa de Plástico é por demais insistente e a todo custo (e muitas custas) tenta invadir os jardins, repito mais uma vez o aviso que Vitalina deu antes de ir se encontrar com Hades: cuidado com a Rosa de Plástico e o Garotinho que a acompanha.
E assim, nesse cotidiano rosáceo, Vitalina testemunhou eleições e golpes. Viu Juscelino passar em frente à sua casa e lhe deu uma rosa. Recebeu Goulart com um botão bem vermelho. Tonteou com tanto perfume que acabou acreditando em Jânio, e lhe deu também uma rosa. Rosa esta que lhe causou uma rusga na vizinhança: Sobral Pinto, o seu amado vizinho, enfureceu-se com o cartaz de uma vassoura que Vitalina cismou em pendurar na janela. O que Sobral nem de longe desconfiava é que Vitalina era uma bruxa ativista que pensava que a tal vassoura era um simples logotipo do PBA, Partido das Bruxas Anárquicas.
Vitalina recusou-se a ceder suas rosas ao golpe. Escondeu-as atrás de uma cerca e à noite, quando a cidade toda dormia, regava-as e podava os espinhos. As rosas cresceram clandestinas. Aprenderam a despitar o aroma e só se abriam quando não havia ninguém por perto. O comunismo rosado era mal visto naqueles dias... Mas Vitalina, militante convicta do PBA, sempre arrumava um jeito de dividir suas rosas com os vizinhos. E foi assim que uma noiva casou-se com um buquê de rosas disfarçadas de jasmins e uma alma cruzou o Leto segurando uma rosa travestida em lírio...
Vitalina não viveu para ver a libertação dos seus canteiros. Morreu durante o reinado golpista. Não levou suas rosas para dar de presente a Hades. Deixou-as comigo junto com um misterioso aviso: " Não deixe que a Rosa de Plástico entre no canteiro."
Depois da sua partida, corri a fazer um cartaz: PROIBIDO ROSA DE PLÁSTICO. Finquei-o bem na entrada dos canteiros. As rosas, avessas a toda e qualquer falsificação, agradeceram.
Até que chegou o dia que Vitalina tanto temia: uma rosa de plástico surgiu nas cercanias. Chegou exalando um perfume barato, uma santidade medíocre, uma ternura suspeita. Escondeu os espinhos, pensando que assim seria bem recebida. Que tola. A tonta não sabia que as rosas nunca escondem os seus espinhos... Mas a Rosa de Plástico pouco sabia das rosas e de tanta ignorância se nomeou Rosinha. Que tola. A tonta não sabia que as verdadeiras rosas não aceitam os diminutivos...
E assim, as rosas de Vitalina expulsaram aquela tosca falsificação.
Mas como a Rosa de Plástico é por demais insistente e a todo custo (e muitas custas) tenta invadir os jardins, repito mais uma vez o aviso que Vitalina deu antes de ir se encontrar com Hades: cuidado com a Rosa de Plástico e o Garotinho que a acompanha.
Escrevi este texto há muitos anos e hoje comprovei a sabedoria de Vitalina quando ao ligar o rádio ouvi a notícia do indiciamento do ex governador Garotinho num processo de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
5 comentários:
Nossa Marcia esse texto é muito bom!
Um de seus melhores.Realmente hoje em dia em meioa tanto politico falso,agente vota não no melhor e sim no menos pior!bjokass=}
Marcia, primeira vez que venho via Guto Leite. Essas rosas raras e reais rasgam a rosinha barata, horrenda e malfeita.
Excelente!
PS: desculpe a aliteração. não resisti
Querida Dona Marcia, acabo de terminar creio que a decima leitura d'O Feitico da Lua. Vim te buscar via Google e me deparei com a excelente surpresa do seu Blog. Obrigada por te-lo! Um beijo muito grande, Lid. PS - Tenho certeza de que um dia as rosinhas de plastico e garotinhos sem escrupulos receberao muitas vezes de volta a consequencia de seus atos. Enquanto isso, vamos plantando nossas verdadeiras rosas.
Fantastico.Simplesmente atual como os ensinamentos de Vitalina. Agora que li seu texto lembrei dos bolinhos de chuva que minha avó fazia com um café forte que até hoje ninguem conseguiu imitar.
Grande beijo querida. Ser moderador de sua comunidade pra mim é uma honra, e mais honrado ainda quando recebo seus textos por e-mail.
E eu não sabia que você tinha um blog!!!! Sou sua fã apaixonada e agora serei uma visitante diaria do teu blog.
Um grande abraço.
Postar um comentário