terça-feira, 18 de maio de 2010

E Um Dia Ela Dormiu...


Quando o telefone tocou, eu já sabia que a Ossuda a tinha levado. Não foi preciso que ninguém me avisasse, a Senhora dos Ossos já sibilara no meu ouvido estranhas sílabas mescladas com chocalhos e uivos de vento. Sílabas brancas, assustadoramente brancas como ossos lavados; como presas de elefantes fantasmas a vagarem por Áfricas ancestrais. Não foi preciso nenhum atestado de óbito que atestasse o óbvio: ela se fora e não voltaria. Nunca mais.
Do extremo da linha telefônica, aflito, meu irmão dizia que ela dormira e se recusava a acordar. Onírica, morta, alheia a agonia ao redor, minha mãe se extinguira como um último cotoco de vela derretida em lágrimas de cera. Embrulhada, enroscada no cobertor, dormia o sono dos mortos, aliviada da carga da maternidade. E eu? Como carregaria o peso esmagador da ausência? Será que ela não pensara que talvez eu não tivesse força para carregar tal carga? Será que não pensou que eu poderia tombar no meio do caminho – sombrio – que se descortinava à frente? Será que não se importou com a invalidez da minha súbita orfandade? Será que o sono da Ossuda diluíra o seu pensamento e a arquetipal responsabilidade materna? Não sei. Só sei que nunca um mero telefonema me soou tão metafísico e sombrio.
Talvez por arte do doce atordoamento que só a metafísica traz, ou por pura birra, deixei o telefone de lado e me afundei na maciez lodosa da poltrona da sala. Não, eu não queria saber dos detalhes, não queria saber quantas vezes meu irmão a chamou, quantas cutucadas deu, quanto tempo passou depois dela passar pela sala, entrar no quarto, deitar-se e passar para o lado de lá, o lado do Letes. Os detalhes pareciam bifes recém cortados, estirados gelados sobre o tampo da pia. Será que ela não se preocupou com o jantar? Toda mãe se preocupa com o jantar. Mas ela já não era mãe. Por ossudociência da Ossuda, virara um não- sei- quê que tanto atormenta os filósofos, se transformara numa não-coisa, numa não- realidade, num tico provável de existência...

11 comentários:

Angela disse...

Estive aqui, lendo seus sentimentos.
Um beijo.

Elaine Cilotti Fratta disse...

Não, ela não pensou no jantar naquele momento, pois de repente ela viu uma luz brilhante e foi checar se encontrava por lá algum astro de cinema, ou se aquela luz toda anunciava que era hora do baile.E saiu toda faceira,decidindo que passaria a ser apenas filha.

Marcia, tenho torcido para que voce se conforme.
Beijos.

Chiquinha Chicória disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Chiquinha Chicória disse...

Não é possível coformar-se com a morte. Ela simplesmente está, nos ronda é assim e não é possível que concordemos com isso. É como tentar entender por que a abelha tem aquela cor, as aguás tem oxigênio... Não é possível. Simplesmente elas são e estão aqui, concordemos ou não.


Conformar é aceitar, estar de acordo, concordar. E concordar, no sentido literal da palavra, é partilhar o mesmo coração. Mas nosso coração não pede fim.


A Ossuda me pregou essa peça. Minha mãe evaporou da minha vista há 28 anos.

Hoje, aos 37 nada é diferente, na minha saudade, na lacuna afetiva. Simplesmente a dor é gasta e a vida nos acaricia umas delícias compensatórias como esta poesia sua que me fez juntar coração, concordar na alma.



Espero que essa dor inevitável vá se misturando com a chuva, o cheiro do mato, os perfumes das rosas, a poesia, os bons cozidos, as frescas ervas perfumando a cozinha, o carinho dos amigos e todas as coisas que nos lembram que a vida é mistério e que, na maior parte das vezes, esse mistério não é um mistério de dor.



Meu forte abraço.

MARNUNEFREI disse...

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Braitner Moreira disse...

Olá, Márcia, tudo bom? Estou propondo uma pauta à Superinteressante para tentar desmistificar alguns preconceitos que a religião Wicca tem sofrido recentemente. Você pode me passar um contato para que eu fale contigo caso tenha a pauta aprovada? Meu e-mail está nesse perfil do Google mesmo.

Abraço e tudo de bom!

Fernanda disse...

Ola Márcia, gostaria que soubesse que vc é muita querida... através de seus livros, vc tem sido uma grande companheira... desde os meus 15 anos, hj com 25 continuo em sua agradável companhia!
E lembre-se o ciclo é feito de morte e renascimento,
volte logo para o blog!
Beijos com carinho imenso!

Anônimo disse...

Olá passei para conhecer seu blog ele é not°10, show, espetacular desejo muito sucesso em sua caminhada e objetivo no seu Hiper blog e que DEUS ilumine seus caminhos e da sua família
Um grande abraço e tudo de bom
Ass:Rodrigo Rocha

David Frazão disse...

ola ola , claro que tenho todo a prazer em ajudar, mas o nome Frazão tem muitas fontes e está dividido de forma muito ampla nesta zona do pais , eu sou natural de uma pequena aldeia na zona do conselho de Alcanena, uma aldeia com de Serra de Santo António ,posso sim tentar fazer uma pesquisa , mas para isso tenho de ter mais informação. o meu avó chamava-me Joaquim Valentin Frazão , e o nome do meu pai é Manuel Justo Frazao, da parte da minha mãe, o meu avó chamava-se Manuel Dias Sarabuga, é possível que em algum dos casos a possa existir uma ligação. comprimentos David

nao consigo enviar mail como resposta,

Café com Verso disse...

Márcia,

Tenho uma livraria/café em Gonçalves, Café com Verso, e gostaria de saber se é possível recebê-la para um evento gastronômico/literário? espero que sim, sou uma leitora e cozinheira de seus livros, que realmente dão certo, no sentido de sabor e magia.
meu e-mail andreia.damasceno@cafecomverso.com

Anônimo disse...

Saudações Marcia.
Bom, gostaria de falar com você em particular. você poderia me seder um email ou msn pra que possamos conversar?
é um assunto que de certa forma levaria uns 10 minutos no maximo.
Att.

Francisco Silva

Chet

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Livrarias são janelas. Livros olham o mundo.Livrarias libertam. Livros revolucionam.

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