De dentro da caixa de jóias elas me fitam, mudas, sem dedos, punhos e pescoços. Do fundo da gaveta, misturados aos lenços e incontáveis miudezas, me fitam sem olhos. Jóias e óculos. Metais, gemas, vidros e microscópicos parafusos. Rescaldo de um incêndio aguado, frio, ventado...
Experimento os anéis e eles não cabem nos meus dedos. Se recusam a entrar. Procuram outros dedos. Anseiam mãos mais leves, alongadas, descarnadas à medida certa, exata. No pescoço os colares sufocam, apertam, dão nó na garganta. Avessos, malcriados, rebeldes, turrões, trancam os fechos e não me deixam entrar.
Me olho no espelho, me sinto ridícula com óculos que decididamente não se encaixam no meu nariz. Deslizam, se espatifam no chão e lá ficam, se arrastando como bebês mijados em busca da mãe. Mas cadê ela? Onde se escondeu? Debaixo de qual coberta? De cetim? De lã? De madeira?
Caetano canta Contigo en la Distancia e por um momento a vejo - por mais que num mero glimpse - no fundo da sala, um pouco à direita da janela. Ela me lança um beijo e o beijo, talvez pela tarde fria, afaga o meu rosto num vento gelado...
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Parece que escreves-tes para mim! Aos cinquenta anos é assim que me sinto! Quem é esta mulher diante de mim... refletida no espelho?
Lindo Marcia, gostei muito!
beijinhos
Mary
Postar um comentário