quinta-feira, 13 de maio de 2010
Jóias, Óculos & um Bebê Mijado
De dentro da caixa de jóias elas me fitam, mudas, sem dedos, punhos e pescoços. Do fundo da gaveta, misturados aos lenços e incontáveis miudezas, me fitam sem olhos. Jóias e óculos. Metais, gemas, vidros e microscópicos parafusos. Rescaldo de um incêndio aguado, frio, ventado...
Experimento os anéis e eles não cabem nos meus dedos. Se recusam a entrar. Procuram outros dedos. Anseiam mãos mais leves, alongadas, descarnadas à medida certa, exata. No pescoço os colares sufocam, apertam, dão nó na garganta. Avessos, malcriados, rebeldes, turrões, trancam os fechos e não me deixam entrar.
Me olho no espelho, me sinto ridícula com óculos que decididamente não se encaixam no meu nariz. Deslizam, se espatifam no chão e lá ficam, se arrastando como bebês mijados em busca da mãe. Mas cadê ela? Onde se escondeu? Debaixo de qual coberta? De cetim? De lã? De madeira?
Caetano canta Contigo en la Distancia e por um momento a vejo - por mais que num mero glimpse - no fundo da sala, um pouco à direita da janela. Ela me lança um beijo e o beijo, talvez pela tarde fria, afaga o meu rosto num vento gelado...
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3 comentários:
Lindo! Espero o livro, entre ansiosa e, já encantada!
um beijo.
Amei!!
Nós sempre nos perdemos
de nós mesmos...
Também me vejo, às vezes,
de soslaio, obliquamente.
Meu carinho.
Adorei isto aqui. Aliás, por "isto aqui" voce pode entender não só o texto - admirável (benzadeus) como o blog, a autora, a cozinha ao fundo da foto que vi em algum nó dessas malhas da rede...o blog e amostras dos textos do filhão...
Foi uma boa visita para começar o dia...
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